Dia Mundial da Poesia: Cinco poetas que você precisa conhecer

Criado na XXX Conferência Geral da UNESCO, em 1999, o Dia Mundial da Poesia, tendo data oficial em 21 de março, celebra o árduo ofício dos poetas em transmitir o sentimento da sociedade no decorrer de diversos contextos históricos. Segundo a UNESCO, o propósito da celebração é instigar a leitura, escrita e produção de poesias ao redor do planeta.

Para comemorar o Dia Mundial da Poesia, o Livre Opinião selecionou cinco poetas que merecem ser reconhecidos. Poetas estes que forneceram, através dos versos, os sentimentos interiores e as facetas da sociedade, bem como críticas em relação ao contexto. O objetivo é transmitir um pouco sobre estes poetas, de modo que o leitor pesquise aprofundadamente as biografias e escritos deixados por estes grandes mestres da poética. Confira a seguir a seleção:

Cacaso

Cacaso

Antônio Carlos Ferreira de Brito, mais conhecido como Cacaso, nasceu em Uberaba (MG), em 13 de março de 1944. Cacaso começou a escrever poesias aos 20 anos, como sambas que ficaram imortalizados nas vozes de grandes sambistas, como Elton Medeiros e Maurício Tapajós. Seu primeiro livro, “A palavra cerzida”, demonstrou seu posicionamento contra a Ditadura Militar, período que vivenciou, tendo em seus versos a criativa crítica ao regime vigente, destacando-se na vertente da poesia marginal. Cacaso faleceu em 1987, aos 43 anos.

Poética

Alguma palavra,

este cavalo que me vestia como um cetro,

algum vômito tardio modela o verso.

Certa forma se conhece nas infinitas,

a fauna guerreira, a lua fria

encrustada na fria atenção.

Onde era nuvem

sabemos a geometria da alma, a vontade

consumida em pó e devaneio.

E recuamos sempre, petrificados,

com a metafísica

nos dentes: o feto

fixado

entre a náusea e o lençol.

 Meu poema me contempla horrorizado.

 Rio, 1965

 (Publicado no livro “A palavra cerzida”, de 1967)

Oliverio Girondo

Oliverio Girondo

Oliverio Girondo

Poeta vanguardista argentino, Oliverio Girondo nasceu em Buenos Aires em 1891. Renovou a estética literária da Argentina, rompendo com a tradição, Girondo incorporou o método que influenciou poetas contemporâneos, fincando de vez seu nome como um dos principais escritores da Argentina. Entre seus livros lançados, destacam-se Veinte poemas para ser leídos en el tranvía (1922), Calcomanías (1925), Espantapájaros (1932), Interlunio (1937) e Persuasión de los días (1942). Girondo Oliverio faleceu em 1967, aos 76 anos.

As Portas

Absorto tédio aberto

Ante a noitefunda inululada

Que em seca greta aberta subsorri seu mais agris recato

Aberto insisto insone a tantas mortessons de incensossom

Revôo

Até um destempo imóvel de tão já amargas mãos

Aberto ao eco cruel por costume de pulso não mal digo

Por mero nímio glóbulo aberto ante o estranho

Que em voraz queda ferra circunrói as parietais costas

Abertas ao murmúrio de maissombra

Enquanto se abrem as portas

(Poema extraído do livro “A pupila do zero”, tradução de Régis Bonvicino)

 

José Craveirinha

José Craveirinha

José Craveirinha

Nascido em Moçambique, antiga capital chamada Lourenço Marques e atualmente Maputo, em 1922, Craveirinha é considerado o poeta maior do país. Vencedor do Prêmio Camões em 1999, importante prêmio de língua portuguesa, tornou-se  o primeiro africano a receber esta honraria. Craveirinha, através de seus poemas, mostrou a desigualdade social de seu país, apontando os problemas das camadas mais baixas de Moçambique, bem como contra o racismo e o domínio de Portugal na época. Craveirinha faleceu em 2003.

Grito Negro

Eu sou carvão!

E tu arrancas-me brutalmente do chão

e fazes-me tua mina, patrão.

 

Eu sou carvão!

E tu acendes-me, patrão,

para te servir eternamente como força motriz

mas eternamente não, patrão.

 

Eu sou carvão

e tenho que arder sim;

queimar tudo com a força da minha combustão.

 

Eu sou carvão;

tenho que arder na exploração

arder até às cinzas da maldição

arder vivo como alcatrão, meu irmão,

até não ser mais a tua mina, patrão.

 

Eu sou carvão.

Tenho que arder

Queimar tudo com o fogo da minha combustão.

Sim!

Eu sou o teu carvão, patrão.

Matsuo Bashô

Matsuo Bashô

Matsuo Bashô

Reconhecido como o mestre do hakai – poemas em três linhas paralelas – Bashô foi um influente poeta no Japão do século XVII. O poeta contemporâneo Paulo Leminski, sendo muito influenciado pelos escritos de Bashô, utilizando a licença poética escreveu a biografia do mestre japonês – texto que pode ser encontrado na recente obra “Vida”, lançado pela Companhia das Letras. Os haikais de Bashô são marcados pela escrita direta pela observação do mundo que vivenciou, transformando em poucos versos as paisagens em que percorria nas suas viagens pelo Japão do período Edo.

Este caminho!

sem ninguém nele,

escuridão de outono.

Anna Akhmátova

Anna Akhmátova

Anna Akhmátova

Nascida em Odessa no ano de 1889, Anna  Akhmatova destacou-se como uma das maiores poetas russas do século passado. Suas poesias expõem as dificuldades que obteve para escrever no período stalinista, bem como na tentativa de consagrar-se no ramo literário apenas encarregado pelos homens. Após a morte de Stálin, em 1953, Anna voltou à cena literária. O poema mais conhecido de sua carreira foi “Réquiem”, em que demonstrou grande habilidade na escrita. Anna também trabalhou como crítica literária e tradutora, ela faleceu em 1966.

O Canto do Último Encontro

Sentia-me sem forças, gelada,

mas os meus passos eram leves.

Na mão direita tinha a luva

da mão esquerda, ao partir.

 

Eram realmente tantos degraus?

Eu sabia que eram só três!

O outono abraçava os plátanos

e murmurava:”Morre comigo!”

 

É o meu destino

que me enganasse e me traísse.

Eu respondi: “Oh, meu amor!

Eu também…Contigo morrerei…”

 

Este é o canto do último encontro.

Olhei para a casa escura,

Só no meu quarto, amarelo e indiferente,

ardia o fogo das velas.

 

Vinte e um. Segunda- feira. É noite!

No escuro uns contornos de cidade.

Algum vagabundo escreveu

que na terra pode haver amor.

 

E por tédio ou preguiça,

todos acreditaram e assim vivem:

esperam encontros, temem adeus

e cantam canções de amor.

 

Mas a outros revela-se o enigma,

e o silêncio repousará sobre eles…

Descobri isto por acaso

e desde esse momento sinto-me mal.

 

Ouvi uma voz. Falava confiante,

Murmurando: “Vem,

deixa a Rússia para sempre.

Eu limpo o sangue das tuas mãos,

do coração arranco o negro pejo,

com outro nome cubro

a injúria e a dor da derrota.”

Tapei os ouvidos com as mãos,

para que essas palavras indignas

não profanassem o meu espírito aflito.

 (Traduzido por Manuel de Seabra)

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