O escritor Caco Ishak lança o romance “Eu, Cowboy” em São Paulo. Escrito em 27 dias, segundo reza a lenda, ainda no ano de 2009, entre Salinas e Copacabana, “Eu, cowboy”, romance de estreia de Caco Ishak, passou cinco anos na gaveta até o escritor ter coragem de editá-lo no ano passado, sendo enfim publicado em 2015 pela editora carioca Oito e Meio.
Com capa de Raffael Regis, ilustrada pelo lendário Guilherme Pilla, o livro conta a história de Carlo Kaddish, um “fracassado” em plena crise existencial dos trinta — ou 27. Descobre ter uma filha, quem, aos leitores, porém, nunca é revelada: não tem nome. Resolve embarcar numa viagem pela América Latina, que, porém, nunca acontece: sua não-viagem. Ancorado com seus amigos na fronteira entre o submundo e a ray-society de Belém: sua “Faixa de Gaza”. Fronteira entre os séculos XX e XXI: o elo perdido.
Um não-livro onde personagens parecem sumir e reaparecer a contragosto do autor, na areia movediça de um deserto líquido entremeado pelas quebras de linguagem, pelos pontos áridos, provocando toda uma estranheza, um DDA forçado, frases de efeito típicas de um comentarista facebookiano, um não-fluxo, o oposto dos beats que se dispunham a botar o pé na estrada, a fluir, e fluíam de fato. A mensagem de Ishak parece simples: hoje, ninguém mais flui; apesar dos tempos líquidos, estamos todos “ancorados numa bóia irrequieta em meio a uma contracorrente inexistencial”.
Como você classifica o cowboy do romance?
“Talvez ele tenha um pé no Cowboy do Asfalto, vivido por John Travolta. Na verdade, o que eu quis ilustrar com o cowboy é realmente aquele personagem do velho oeste. O cara machão, estilo Clint Eastwood. A primeira impressão com o cowboy do romance é justamente a do machão, machista, retrógrado, mas na verdade não foi ele que colocou o título de cowboy, colocaram o chapéu na cabeça dele. Tentei retratar o meu cowboy como sendo um elo perdido entre o século XX e XXI. Na verdade, ele está perdido no século XXI. A capa do livro achei muito boa, porque o “Eu” está enorme, bem na cara, que ilustra bem o egocentrismo do personagem, o que faz recair em nosso tempo, onde todo mundo está com um rei na barriga. Esse “Eu” acaba sendo todos. Nós, cowboys!” [Confira a entrevista completa com Caco, realizada pelo Livre Opinião – Ideias em Debate, em que conta detalhes da produção do romance].
SOBRE O LIVRO
“Aos 27, ou você se entrega e vira epitáfio imortal em Père Lachaise ou junta seus amigos num Challenger e segue pro México. O alter ego Ginsbergiano de Caco Ishak fica entre as duas opções, escrevendo um livro pros que andam errado, pros que sabem que a dois é impossível. E por mais que tente negar, não disfarça, ‘não bloqueia os fatos’. Escreve na velocidade das turbinadas diligências da Wells Fargo, como se ‘fracasso’ fosse uma substância fatal e inevitável e, ao mesmo tempo, o antídoto pro mal (?) que aflige aqueles que acordam todos os dias tentando ‘odiar um pouco menos a humanidade’.”
(MÁRIO BORTOLOTTO)
“O alter egocêntrico e autoboicotador serial Carlo Kaddish de Caco Ishak é neto dos errantes beats mas erra sempre que tenta sair do lugar, uma Belém pós-tudo que bem poderia ser Xangai e onde o nervo da contemporaneidade lateja sem trégua. Façanha de linguagem estetizada que às vezes sugere um enxerto absurdo de Riobaldo com Rick Deckard, ‘Eu, cowboy’ atira para matar. Entra por um ouvido e duvido que saia pelo outro tão cedo.”
(SÉRGIO RODRIGUES)
“Saiu o ‘Eu, cowboy’ do Caco Ishak e digo apenas que: aprovo”.
(DANIEL PELLIZZARI)
“Eu adoraria ter escrito este romance. Eu adoraria ter criado este ritmo. Este fluxo. Este nada. Ser dono dessa merda toda. Eu adoraria ter pulado estes parágrafos únicos. Ter me lançado nos abismos desta ‘bioficção’. Eu adoraria ter conhecido um coração carioca. Ter acreditado no amor acidental. Ser pai de uma menina de olhos caídos. Eu adoraria este tipo de paternidade. Meu filho ter nascido assim. Um incendiário garoto prodígio. Jogador doente de basquete. O futuro jogado no lixo. Sem sucesso. Sozinho. Sem amor. Um punheteiro. Don Juan donzelo. Maníaco depressivo. Eu adoraria. Juro. Seria capaz de dar a minha vidinha em troca desta vidinha. Sei lá. De todas essas vidinhas ao redor. É um pior do que o outro neste livro. Eu adoraria ter crescido no Pará. Chafurdado na lama de seus rios. Belém bélica. Cidade perdida. Melhor ir embora para a América Latina. Eu adoraria ter pegado este barco furado. Caído na mesma estrada de Jack Kerouac. Um artista frustrado. Adoraria. Ser autor desta história inglória. De diálogos sem diálogos. Ninguém entendendo nada. Cada um por si só. Às gargalhadas. Rindo desta desgraça. Bebendo uma. Eu adoraria. Fumando um. Eu adoraria. Cheirando a pó. Cheirando a chulé. Um pé-rapado. Daria tudo por um cigarro. Um carinho. Um passado mais bonito. Linha por linha. Não ter este destino. Selado. Mais morte do que vida. Em qualquer cidade. Bolívia. Rio de Janeiro. São Paulo. É sempre isto. Adoraria ter feito Hermano. Murilo. Rudie Ruth. Manoela. A turma toda. Cada uma das pessoas-personagens. Deus. O Diabo. Ter testemunhado Caco Ishak. Na hora do mergulho. Deste acerto de contas. Desacertado. Eu adoraria ter estado ao seu lado. Adolescente. Assistindo à MTV. Conferido o momento em que ele resolveu desequilibrar a narrativa. Ir fundo aos sons mais sujos. Acreditar que a palavra é quem filma. Desenha. Levanta do nada uma existência. Esta linguagem filha-da-puta. Fodida. Molhada. À vera. Enxuta. Faminta. Tomando no rabo. Botando para foder. Eu adoraria ter sido o responsável por isto. Por este romance de estreia. De um cara que já era poeta. E continua sendo. Único. Para valer. Doa a quem doer. E como dói. Adoraria ter sido eu este Cowboy. Em cima deste cavalo. Um anti-herói brasileiro. Mas não teve jeito. Este livro não fui quem escreveu. Não deu. Por isso assino embaixo. Apenas o texto desta orelha. Como escritor. Eis o meu grande fracasso.”
(MARCELINO FREIRE)
SOBRE O AUTOR
Caco Ishak nasceu no ano de 1981, em Goiânia. Excomungado pela comunidade, acabou sendo adotado por Belém, onde vive desde os cinco, exilado em seu apartamento. Autor dos livros de poesia Má Reputação (2005) e Não Precisa Dizer Eu Também (2013), ambos publicados pela Ed. 7letras, escreveu Eu, Cowboy ao longo de 27 dias ainda no ano de 2009, em Salinas e Copacabana, deixando-o na gaveta até 2014 — “el giro”. Primeiro romance. Três filhas, dois gatos e um ukelele sem cordas. Leitor de Judith Butler, Susan Miller e Catalina Arroyave. Nunca abriu um livro de David Foster Wallace.
SERVIÇO
Lançamento “Eu, Cowboy” em SP
Local: Cemitério de Automóveis SP (Rua Frei Caneca, 384)
Data: 27/8/15 (quinta-feira)
Hora: a partir das 19h
Valor: R$ 35,00 (dinheiro e cartão)