eterno
serviço
de casa, a luz da cozinha acesa e a noite
Alta,
as pessoas lá fora parecem felizes,
os outros apartamentos descansam de velho
enquanto o meu
cheira a Bife
e barulho de panela ariando.
Tive medo de ir até a cozinha e Ela me dizer que não fui capaz de tirar o feijão da panela pra ajudar um pouco, eu
não Fui,
Mesmo, estou cansada. O serviço de casa me entristece porque me chegou precoce, aos 13 eu só podia ir pra rua depois de dar banho na
irmã,
Lavar o banheiro, secar a louça, aspirar a sala, passar as fronhas então
sim,
eu podia sair mas
Eu já estava sem saco depois de terminar tudo isso e meus amigos estavam na rua fazia
tanto tempo,
passava horas imaginando a felicidade deles que eu nunca senti, os assuntos que eles teriam em comum na escola numa segunda-feira de risadas e eu
muda,
feia,
Querendo amor te,
ser adolescente foi gastar meu viço trabalhando duro ao lado da minha mãe. Minha mão nunca mais ficou bonita, culpa do excesso de
produto
de limpeza. O banheiro aqui de casa é um brinco. Quem gosta são as visitas, nunca faltou papel higiênico porque deixamos sempre outro
de reserva
ao lado, é uma regra
da casa.
Quando eu era pequena, minha avó me chamava de
-Santinha.
Porque eu nunca reclamava de nada.
Quando cresci com 15,
eu tentava reclamar, mas
tomava tapa
na boca
e minha mãe me chamava de:
-sem vergonha.
Porque dizia que eu não queria trabalhar. Nem Casar. Só queria ler, assistir seriado Americano e fazer
teatro, isso era coisa
que não ia prestar, ela dizia ao telefone, preocupadíssima. Eu escutava do quarto, em silêncio, também preocupadíssima.
os meninos
da escola
me chamavam de.
-puta.
Porque eu beijava muitas bocas pra esquecer os tapas
na boca e nunca
conseguia. Eu deixava os meninos passarem a mão na minha bunda logo no primeiro beijo. Deixava eles passarem a mão nos meus peitos, nas minhas coxas, no meio
das minhas coxas, eu queria muito
Sentir qualquer coisa
que fosse boa mas só quem sentiam eram eles, ao que parece, pelo menos na hora em que estávamos juntos. Depois
eles me xingavam de tudo quanto era nome inclusive na lousa, ou
seja, não gostavam de mim.
eu lia
p u t a
no quadro
negro logo de manhã e sabia que era um recado pra mim ao mesmo tempo que aquilo não cabia
direito
em mim e esse ciclo
só me fazia sentir cada vez mais sozinha,
miúda,
deitada na vida que não era a minha, era
A minha mãe.
Aline Bei
A busca ou o processo.
(nunca o pronto)