Iniciado a partir de uma convocatória nas redes sociais para se descobrir em que recônditos do país estavam as benzedeiras, a primeira produção do Coletivo Urucum conta a história de seis mulheres que se dedicam à cura por meio da fé; após a exibição do documentário, elas participam de debate com integrantes do grupo e com o público
Em mais uma programação especial do programa Quintas Musicais, o Itaú Cultural optou por estrear um filme em vez de um show. No dia 26 de novembro (quinta-feira), às 20h, é exibido Toda Reza, em primeira mão e simultaneamente em São Paulo e em Salvador. O documentário assinado pelo Coletivo Urucum tem a proposta de resgatar, valorizar e preservar a cultura indígena e afro-brasileira, assim como desmitificar e disseminar conhecimento sobre o ofício de benzeção. O filme mergulha na trajetória de Maria da Conceição Pereira Marques, Merces Alves Viana Rodrigues, Rose Kareemi Ponce, Dona Suelly, Pilar Alvarez e Teresinha Pires, benzedeiras que moram no estado de São Paulo e atuam no tema da produção. O lema delas é: “Há quem necessite, há quem negue, e cada vez menos há quem faça.”
O idealizador e diretor do filme Elirone Rosa conta que a ideia para o documentário partiu da constatação de que era necessário trazer um olhar diferente sobre o trabalho das benzedeiras e atualizar o tema, já que ainda sofre muito preconceito. “Essa prática faz parte da cultura brasileira e é marcada pelo sincretismo religioso, misturando as culturas africana, indígena e o curandeirismo”, justifica ele sobre o tema da produção aprovada em 2015 pelo VAI, programa para a Valorização de Iniciativas Culturais, da Prefeitura de São Paulo.
Mesmo com esse aporte, o trabalho não foi fácil. Rosa contou com a parceria de Cássio Rodrigues, Fernando de Sá, Filipe Bezerra, Gabriela Miyake, Gabriel Arruda, Karen Furbino e Rodrigo Lima, outros sete estudantes de cinema e também integrantes do Coletivo Urucum, para encontrarem profissionais da benzenção. “Como no começo tivemos dificuldade de encontrar as benzedeiras, colocamos um post no Facebook que foi muito visto, e para a nossa surpresa apareceram indicações de pessoas em diferentes estados do país”, recorda o diretor.
As benzedeiras
Apesar da comprovação de que a atuação das benzedeiras ainda é presente em localidades diversas dentro do território nacional, Toda Rezafoca o trabalho delas na região metropolitana de São Paulo. O documentário traz os relatos de seis mulheres que ainda hoje exercem o ofício da cura, apresentando suas histórias, crenças e fé, em uma reflexão atual sobre religiosidade, preconceito e o sincretismo.
Merces Alves Viana Rodrigues nasceu em 1950 na cidade mineira de Ouro Branco, e aos 16 anos mudou para Ferraz de Vasconcelos, em São Paulo. Neta de portuguesa e filha de mineiros, é a segunda filha entre 12 irmãos. Começou a benzer quando tinha 19 anos, acumulando quase 45 anos de rezas. Anualmente realiza festas beneficentes em localidades próximas de onde mora, distribuindo doces e fazendo almoços. Benze pessoas todos os dias em sua casa.
Rose Kareemi Ponce tem 49 anos e é descendente direta de índios Guarani. Atualmente mora em Salesópolis, também no estado de São Paulo. É mãe de três filhas e realiza o trabalho O despertar das benzedeiras, que reúne um grupo de mulheres para falar da cura natural e para, segundo ela, despertar esse dom que todos têm. Também realiza encontros e palestras sobre o sagrado feminino.
Maria da Conceição Pereira Marques nasceu em Sabinópolis, Minas Gerais, em 1951. Neta de portugueses, transferiu-se para São Paulo aos 13 anos, para trabalhar com o pai. Ela conta que começou a rezar após uma revelação de um anjo, que lhe falou sobre o seu dom com as palavras. Além de benzedeira, é também profeta e já publicou o livro Mensagens Proféticas. É católica, mas recebe pessoas de todas as crenças e credos no quintal da sua casa, onde benze sempre de quarta-feira a sábado.
Mãe de santo, Teresinha Pires atua como benzedeira há mais de 20 anos. Descendente de italianos, aprendeu a rezar com a sua mãe, e hoje dá continuidade ao trabalho iniciado com crianças da vizinhança. Aos 80 anos, não costuma benzer adultos. Quando eles aparecem à sua porta, ela os encaminha para o terreiro, onde a benzedeira conta com um respaldo espiritual e para poder ajudar melhor a pessoa. É católica e vai à missa aos domingos.
Dona Suelly, hoje com 68 anos, é paulistana, mas foi morar em Rio Grande da Serra quando tinha 50 anos. Já pertenceu a diversas religiões e hoje é mãe de santo e cuida do seu terreiro junto a seus filhos de fé. Também realiza um projeto social independente de distribuição de cestas básicas aos moradores ao redor e realiza em sua casa diversas ações sociais levando filmes e atividades para as crianças, com cuidado ao fazê-lo para não confundirem as coisas. “O meu trabalho social não tem nada a ver com a minha religião. Eu evito misturar os dois”, ressalta.
A última benzedeira a ser contatada foi Pilar Alvarez. Descende de espanhóis, nasceu em 1956, no bairro da Vila Maria, em São Paulo, onde ficou até os cinco anos, quando se mudou para o bairro de Santana, Zona Norte da capital, onde vive ainda hoje. Aprendeu a rezar com a sogra em uma véspera de Natal. Atendendo em sua casa, já benzeu grande parte das crianças da vizinhança. É católica e diz não frequentar muito igrejas, apesar de carregar sempre as suas santas consigo.
Sobre o Coletivo Urucum
Juntos em seu primeiro projeto, os oito integrantes do Coletivo Urucum são jovens cineastas, que tem como proposta utilizar o cinema como ferramenta para dar luz a aspectos culturais e históricos. A sua proposta é trazer contribuições para o olhar cinematográfico brasileiro com inquietações de questões sociais atuais. Com diferentes experiências de vida e histórico profissional na produção audiovisual, são estudantes e, sobretudo, amantes do cinema.
Agrônomo, fotógrafo e produtor, Cássio Rodrigues, 33, é assistente de direção na Primor Filmes, e produtor também no coletivo O Grito, além do Urucum. Assina a produção do filme Toda Reza, idealizado e dirigido por Elirone Rosa, 21, técnico de Comunicação Visual, Publicidade e Propaganda e Computação Gráfica, e finalizador na O2 Filmes.
Fernando de Sá, 25, é editor, câmera e técnico em produção. Na Produtora Letra e Ponto, atua na edição e produção, e responde pela montagem no Coletivo Urucum, que tem Filipe Bezerra, 22, como técnico de som do filme de estreia. Bezerra atua ainda como assistente de montagem, técnico de som e desenhista.
Também produtora no Urucum, a estudante de História e de Cinema Gabriela Miyake, 22, é assistente de edição de som, técnica em storyboard e produtora. Gabriel Arruda, 23, trabalha como técnico em produção, câmera e faz direção de fotografia e correção de cor. No coletivo, assim como em Toda Reza, é responsável pela fotografia.
No documentário, Karen Furbino, 25, fez a direção de arte e a produção executiva. Técnica em design de interiores, cenógrafa e cenotecnica, é produtora e atriz no Grupo Quereres de Teatro. Rodrigo Lima, 32, responsável pela identidade visual e motion design de Toda Reza, é design e editor na empresa Defoco, além de fotografo e designer no Urucum.
FICHA TÉCNICA
Direção: Elirone Rosa
Fotografia: Gabriel Arruda e Rodrigo Lima
Direção de Arte: Karen Furbino
Som direto: Filipe Bezerra
Produção: Cassio Rodrigues e Gabriela Miyake
Produção executiva: Karen Furbino
Montagem: Fernando de Sá
Edição e mixagem: Ari Oliveira
Colorista: Alex Lopes
Trilha: Guilherme Moscardini, Jurah de Anin e Maíra da Rosa
Id. Visual: Rodrigo Lima
Finalização: Elirone Rosa
SERVIÇO
Quintas Musicais
Lançamento do documentário Toda Reza, do Coletivo Urucum
Com debate entre diretores e benzedeiras
Dia 26 de novembro de 2015 (quinta-feira), às 20h
Duração: 80 minutos
Classificação indicativa: livre
Sala Itaú Cultural (249 lugares)
Entrada franca (ingressos distribuídos com 30 minutos de antecedência)
Estacionamento com manobrista: R$ 14 uma hora; R$ 6 a segunda hora;
e mais R$ 4 p/ hora adicional
Estacionamento gratuito para bicicletas
Acesso para deficientes físicos
Ar condicionado
Itaú Cultural
Avenida Paulista, 149, Estação Brigadeiro do Metrô
Fones: 11. 2168-1776/1777