as palavras
uma atrás das
outras, combinadas e ditas pela boca de pedro
com aquela voz
larga de quem já tinha visto o caminhão dos sonhos chegar,
o caminhão
dos sonhos
passar,
o caminhão dos sonhos bater
no Poste da casa
azul e deixar em tédio
a rua toda
sem luz.
as palavras de pedro evocavam o dicionário dos bêbados que amam demais, por isso bebem, porque o tranco do amor é muito forte.
aquelas palavras depois frases depois
blocos de frases depois a conversa inteira
faziam ela ter
total dimensão de estar viva. Ela mesma
já bebeu demais. Agora
suco de acerola no almoço quando o garçom pergunta
o que a senhora
gostaria de
beber.
Era gingante ter a consciência do pensamento e do coração ao mesmo
tempo, sem valorizar 1 mais que o outro, era junto ouvir
o Pedro dizendo o que ela
sentia e não conseguia externar para além de um papo por baixo do cobertor pós-sexo com o
ex-marido, a única pessoa que teve com ela um pouco do gosto da verdadeira
intimidade.
Com o ex marido ela dizia desses sentimentos sem nome que precisam de frases inteiras para que as pessoas entendam o que
eles são, não como o Amor. Quando se diz a palavra amor as pessoas dizem:
–ah sim.
eu sei o que é
amor.
E balançam a cabeça, resignadas.
Os sentimentos sem nome seriam mais como aquela bochecha quente que a gente sente quando não sabe se beija na boca ou no rosto no tchau do carro e você decide ser no rosto e o outro decide ser na boca e fica um impasse de anos que durou segundos. Esse sentimento não chama vergonha, nem falta de coragem, nem tesão enrustido, é um sentimento que
ainda não tem nome nem por isso
menos sentido.
O Pedro
traduzia em língua humana o que ela era por dentro sem dizer. Ela
tinha
aquela língua
guardada nos cantos dos ossos.
o tempo passa sem palavras
ele disse,
e ela lembrou da sua vó vestindo pulseira colorida funcionária pública, hoje morta
há 10 anos.
quem tem o poder de peneirar é a gente,
ele disse
e ela lembrou do primeiro caderno de poemas da sua vida, ele tinha uma capa de calça
jeans,
no lugar onde eu moro não tem parede
ele disse
e ela pensou que o céu também não,
a natureza não deixa eu ficar triste
e ela perdeu por uns segundos o medo
de borboleta porque
passou 1 e ela não correu. Só sentiu a beleza de dividir o mundo com alguém que
voa.
as palavras de pedro
acariciavam como língua macia nos seios, os bicos
imploravam, ela tinha
seios Enormes num volume de carne redondo e
preto até que chegou no
Êxtase antes mesmo do fim da conversa: gozou com letras soltas saídas pelos poros, discretamente. Ninguém no restaurante notou
também porque ela foi a primeira pessoa que gozou
com palavras em todo o mundo.
Depois,
sugiram outros casos e de vez em quando as pessoas falam sobre isso, mas
é difícil
porque gozar assim também não tem nome.