Coluna 51 – Apresentando: Lourenço e Lucimar

5719dfce-16d8-4fa9-9372-1a712bad62f3Já falei várias vezes que meu epitáfio será “vai ser bom, não foi?”

É isso

Esperei tanto o dia e já passou

Não sei se vocês perceberam a minha alegria ao apresentar o Primeiro Prêmio Oceanos na terça, dia 08 de dezembro de 2015

Faço questão de registrar a data porque foi histórico. Precisa ser documentado. Entra para a minha história e para a do meu marido

Nós conhecemos a Selma Caetano em 2006, na Flip, pelas mãos do Marcelino. Aliás, quando ela e o Claudiney me convidaram, na primeira reunião eu perguntei: isso é coisa do Marcelino, né?

No centro cultural b_arco, onde navega o mar de Marcelino, ou Celino, aquele que caiu do céu, eu já conheci muitas gentes (eu acho que o certo é no plural porque são muitas pessoas mesmo). Incrusível (eu adoro falar essa palavra assim) tinham muitos amigos da Oficina na plateia <3

O Marcelino, numa festa, ele é o anfitrião. É o cara que apresenta todo mundo e, ao anunciar uma pessoa para a outra, ele não fala somente o nome, ele diz também uma característica que coloca estranhos em um lugar mais próximo do outro

– A Lucimar trabalhou na Livraria da Vila – confirma a Cida, da Fradique

– É professora também – Bruna e Clarissa me atordoando com uma presença completamente inesperada depois de 20 anos – bora tomar café em janeiro, meninas – figurinhas de comidinhas coloridas J

– Agora é escritora – essa afirmação é a mais difícil porque não tem um trabalho fixo, não tem horário nem salário, não tem disciplina, não tem regra nem almoço na hora certa. A louça acumula na pia, a roupa fica em cima da máquina durante semanas porque a escrita me consome, me balança, me tira do prumo, me deixa ansiosa e mansa. A escrita me salvou durante este ano. E não foi só a escrita. Foi principalmente meu marido e meu filho. Depois a minha família gigante: irmãos, cunhados, sobrinhos, sobrinhos netos, primos e tios, próximos ou distantes. Todos unidos por um único aparelhinho que muitos acham que afastam as pessoas. O celular é mais um meio de comunicação e assim como as cartas, telegramas, telefones fixos e sinais de fumaça e todas as redes sociais do mundo, o celular nos une. Estamos aqui, sem fazer nada, o marido e o filho no trabalho. As quatro gatas dormindo, muito bem alimentadas. Você já botou a roupa de molho e o feijão no fogo. Varrer não precisa porque amanhã tem a Dalva e ela sempre acha graça

– Meu Deus, a banda do circo passou por aqui?

Nesse meio tempo que você fica de bobeira é o tempo exato para trocar figurinhas com quem você sente saudades. O grupo da zueira da família, o grupo sério dos cuidadores que você entra só para fingir que está entendendo tudo e mandar um jogo da velha para tirar a tensão do assunto. Dois grupos dos amigos do Dom Pedro, um de verdade e outro de mentirinha. As meninas da Unesp. Músicas com Elaine

As meninas do Martelinho você encontra no gmail ou no face para acertar os detalhes do Fancine. Se bobear elas vem parar na porta da sua casa para devolver seu marido bêbado mas ninguém precisa saber disso, é um detalhe muito íntimo da sua vida melhor não contar – figurinha de brinde para Maria Regina e todas as marteletes que nos dão carona sempre <3

Grupo novo, Palê no Barco. Simone me apresentando suas amigas e Isadora, não fica aqui sozinha. Espera com a minha família lá dentro. Será que você tem fôlego para entrar em órbita e mandar as novas parceiras para o espaço, deixá-las no mundo da Lua e ficar duplamente feliz na Balada Literária???

Outro livro? Mas, tia, eu nem comprei o primeiro ainda – girassol pequenino sentadinho no meu colo

Não precisa comprar o importante é ler

Não foi isso que você falou no grupo da família

Quem quiser ler vai ter que comprar – e mesmo sem ler uma linha a família inteira comparece em peso. Todos compram seu exemplar e pedem autógrafos com figurinhas – pode escolher tem do Batman, do Snoopy, Garfield, Lucy, Mafalda, Magali e Calvin

Tem essa da Sara Kay? Hoje é Terceira pessoa

01 de novembro “Só aos domingos”

Esse caderno da Lucimar tem uma capa tão infantil – Woody Allen chorando na lembrança que meu marido conta agora enquanto procura o carrinho do Bob Esponja; desconfio que o Carlos escondeu mas quem sou eu para estragar a brincadeira de alguém

Criança escritora que quer comer de um tudo, visitar tudo e todos e quase esquece da hora de voltar pra casa. Fica feliz quando a Dri chega de surpresa, com o vestido azul que foi no casamento, com a Amanda Amada, homenageada no palco e na página do Glauco, o Otinho e o Lino estavam lá na Martins Fontes com a Jessiquinha e você nem falou que não postou a foto porque aquele álbum é público, melhor ficar só no particular

A Dri da Stellinha não pode ir no lançamento para cuidar da mãe mas manda flores, brigadeiros de todas as cores e cupcake de brigadeiro

Não repete brigadeiro porque o texto perde o ritmo

Olha o cartão da Hello Kitty, deixa eu fotografar para mandar pra Dri da Unesp. A gente tem um grupo também. Regina, Ana e Louise. Podia incluir a Aninha e a Sonia, elas iam ficar bem felizes

Não tem problema, eu quero mais é repetir brigadeiro mesmo e compartilhar todas as figurinhas de papel que achei na agenda de 1991 com outra Dri, a companheira de Bradesco, da Lambada e do Teatro e de tantos passeios reais e imaginários que vai ganhar uma coluna só pra ela. Para ler junto com a família toda e ficarem unidos porque em alguns momentos da vida a gente aguenta até aquela tia casca de ferida, pergunta pra Paula

– A Paulinha do Renato?

Não, a Paula Febbe. E cala a boca porque a Paulinha já terminou com o Renato faz uns doze anos e o Panelinha nem existe mais

O Panelinha acabou? Por quê???

Tinha um cara muito chato. A gente era obrigado a ver só os filmes que ele queria rever. Acabou. Pronto. Não tem mais e morreu o assunto

Você não postou também a foto do Odjaki com o Rogério

Claro que postei, você que não curtiu

Porque você posta demais, não consigo te acompanhar

Para de me seguir

Sério que não é pecado filha não aceitar a mãe no face?

Claro que não, tia. Pergunta pra Lorena. A Edna tentou adicionar e quem disse que ela deixa – carinha amarela piscando o olho direito

Como a gente gosta de falar da vida dos outros

A gente só fala de quem a gente gosta

Mas você gosta de todo mundo

É, vamos mudar de assunto porque eu esqueci completamente onde o texto estava indo

O Marcelino me apresentando esquece que fui monitora dele durante três anos e aprendi muito – indicadores e polegares formando aquele coraçãozinho maneiro

Cadê o Rodrigo Lacerda? Já foi? Queria dar mais um abraço nele

Viu o Klink?

Não vi

Caramba. Ele tava sentado na primeira fila

Eu troquei de óculos

Desculpa, tinha esquecido

E não falei que eu ia cantar pra você, naquele palco iluminado?

Mas você vai cantar a música inteira?

Na hora você vai ver

Eu não gosto de surpresas

Marcelino é um santo. Até seu nome é de anjo. Será que já tem bonequinho que a gente aperta a barriga e ele fala: Amém, Jesus!!! Vamos reverberar!!! Diga logo, mulher, o que tem pra dizer!!!!!!!!!!!!!!!

É curioso que não lembro nunca dele ter me apresentado como a esposa do Lourenço Mutarelli. Ele fala, conhece a Lucimar, é minha amiga!!! Marcelino afirma

Não tenho nenhum problema em ser a esposa do meu marido porque, se tivesse, teria que falar pra ele, não pra vocês

Quando postaram a primeira versão do convite, não colocaram o meu nome e nem o da Selma na realização do roteiro da festa. Foi um erro de comunicação e o convite ainda não tinha sido aprovado por todos da equipe e alguém postou no facebook (acho que fui eu) – duzentas carinhas amarelas gargalhando

Eu falei, isso eu juro, eh verdade, que não ligava para que tivesse meu nome no roteiro mas o da Selma era fundamental. A Selma foi nossa guia, mentora, organizadora. E é isso que os artistas precisam: alguém que cuide das contas, que venha lavar louça ou passar a roupa que se acumula há nove meses, dar uma varridinha no chão ou achar a blusa preta da Jessica que sumiu. Simplesmente sumiu. A bagunça está orgânica. Tomando a casa toda. Estamos vivendo tipo dentro de um conto do Cortázar

Eu estava mais preocupada em devorar todos eles na minha cama, ler tudo e depois doar no facebook

14 livros nacionais

Não doa esses, eu queria guardar

Tá certo. É importante, vamos guardar

No máximo, emprestar para algum amigo querido

Amandinha ficou meio decepcionada

Achei que era tudo improviso e, quando li o roteiro, tava tudo lá

Mas na hora que a gente criou foi de improviso

Essa observação dela me fez pensar em tudo que a gente vê e ouve e sente sobre a ficção e sente que é verdade. Eu ia escrever que foi feito sem máscaras, que a gente foi a gente mesmo mas não foi

Na vida real, cotidiana, o Lou é mais falante, mais engraçado. Eu sou mais quieta. Não gosto de conversar em grupo. Gosto de conversar com uma pessoa só

Quando escrevo, estou falando para você e com a vantagem de não ser interrompida – carinha azul sorrindo e piscando o olho esquerdo. Eu fiz o papel da professora e livreira

O Lou domina a plateia. Ele fala e a gente fica embasbacada ouvindo. Foi assim que me apaixonei pelo Lourencinho, numa palestra

Quando a gente entrou no palco do Auditório Ibirapuera, para fazer um reconhecimento do local e definir algumas marcações, fiquei maravilhada com o tamanho do palco. Era um absurdo de grande. E é o mesmo palco que abre para o parque. Dessa vez, Niemeyer, vou te dizer, é uma lindeza das mais lindas

Encarei as cadeiras

Parece o auditório do Etapa

Eu já tive uma experiência no palco do TBC e quando trabalhei de Livreira, você precisa agir de acordo com o freguês, cliente, colega ou amigo que passa para te pedir uma sugestão de livro. Tudo é teatro, tudo é fingimento, encenação, embuste, dramático. Tudo é muito falso e verdadeiro. Juntos e misturados

É claro que tem aqueles clientes que não são nem pessoas, chegam na hora que você está fechando e ainda fazem aquela expressão de nojo

– Mas já? Faltam cinco minutos pra meia noite. Posso só dar uma folheada nos livros enquanto espero a minha amiga?

Pode, né? Você vai falar não?

Esse era meu retrato antes de trabalhar no comércio. Achava que todos estavam ali para me servir na hora que eu queria

O meu primeiro texto publicado, na vida, falava alguma coisa de teatro, tablado, palco. Preciso achar para te mostrar aqui mas era uma coisa mais ou menos isso. Um lugar banal que todo mundo já sabe. A vida é tipo um teatro. Em cada situação você age de acordo com o público. É muito parecida com a apresentação de um prêmio. O problema é que, na vida, a gente ensaia pouco. E você precisa ter alguém de confiança que segure a sua mão e perceba que se ela está quentinha é porque está tudo bem. Quando um derrapa, o outro salva. A gente precisa estar ligado um no outro. Essa você nem precisava me ensinar, Dr. Carlos

Minha preocupação era enxergar a pessoa sentada na última fileira

Durante o ensaio foi tranquilo, mas na hora que era pra valer eu percebi um problema que durante os ensaios não me pareceu grave; eu uso dois óculos, um para perto e outro para longe. Já tentei o multifocal e não me adaptei

Ou seja, ou eu lia o conteúdo das fichas ou eu olhava para a minha família e meus amigos. A Márcia era fácil porque sua blusa era branca e azul. Quando eu a localizava aí achava todos porque estavam sentados um ao lado do outro. Consegui ver o Ailton, o Lucas, a Maria Lucia. A Dri, eu não lembro de ter visto mas lembro que uma hora eu olhei e ela tinha virado o Otinho. Sabe aquela olhadinha rápida quando você vê algo e volta o olhar para conferir o que viu? Foi tipo isso

O Lino eu via e ouvia um sussurro muito baixinho vindo dele. Que programa mais chato esse da tia Luamar, ele deve ter pensado. Tadinho. Mas depois ele se divertiu lá fora procurando um gambá ou algo parecido. Não lembro muito bem porque quando acabou eu comecei a beber tudo que me ofereciam e fiquei bebaça – trinta carinhas amarelas gargalhando. Alguns amigos tem áudios do whatsapp que podem ser usados contra mim – quem manda brincar de zueira que never ends…..rs

Jorge e Jiro, meus editores. O primeiro e o último. Presentes

O pior foi encontrar a Yudith, minha professora da USP. O Lou jura que não dei vexame nenhum mas preciso reencontra-la sóbria para garantir meu doutorado – duas meninas sorrindo, de mãos dadas

Eu queria citar o nome de todos que tinham ido e o Lou não deixava, ele queria que acabasse logo. Coitado, ele estava mais nervoso do que eu. Só entendi depois, ele me explicava e eu não entendia

O Lourenço é muito tranquilo para falar sobre ele mesmo, sobre o seu trabalho. Ele dá palestras há 24 anos. É um profissional Aquela palestra na Gibiteca foi a primeira vez do Lourenço??? Será??? Vou esperar ele acordar para perguntar – menino e menina se encontram e são abençoados pela Lua <3

Eu prefiro falar dos outros. Fui professora durante 20 anos e ficava esmiuçando a vida dos artistas para divertir os alunos. Ninguém queria saber a pincelada, a estética, o envolvimento com o partido comunista, cores primárias, secundárias e terciárias. Todo mundo queria mais é saber quantas mulheres o Picasso teve, se alguém quisesse comprar a Mona Lisa, quanto valia, se o Van Gogh era namorado do Gauguin. Minhas aulas eram um horror, fofoca pura. Ninguém estudava e ninguém aprendia nada importante, a gente conversava muito e produzia muito pouco

Hoje aqui, sentadinha, na poltrona velha, a única que tem lugar marcado, fazendo tricô com óculos – armação emprestada do meu marido que o Paulo, filho do Pedro fez tão rapidinho – de leitura e coque de vovó, entendo que eu também quero a sala de bate papo ao vivo

Parece a Vovó Donalda – torta de maçã para esfriar na janela

Lembrei da Dona Benta, lendo historinhas para os netos e sobrinhos

Quero os podres embaixo das pedras do Estevão, vontade de saber tudo que não foi deixado por escrito, sentar ao lado do Silviano Santiago e segurar a sua mão enquanto ele permanece mais um minuto em silêncio. Decorar todos os poemas da Luci Collin e ficar amiga dela no face e trocar figurinhas

Ficar curiosa para chegar logo ao final de A primeira história do mundo. Dançar com o Rodrigo Naves, flutuando sobre aqueles tapetes mágicos. Mergulhar nas ondas breves e profundas do Alcides Villaça. Ficar orgulhosa das minhas raízes indígenas com o gigantesco Totem erguido pelo André Vallias

Ficar engasgada com vontade de contar pra ele que a minha bisavó foi pega no laço e obrigada a casar com meu bisavô e a minha vó era muito estúpida comigo e fica quieta, aqui não é lugar nem hora

Enlouquecer com o irmão alemão do Chico e se agarrar nele pra cima e pra baixo, no trem, no metrô, a pé na Paulista, grifar o livro inteiro e não querer emprestar pro marido

Se eu te tirar no amigo secreto, eu compro um pra você. Melhor, vou comprar dois. Um pra você e outro para meu amante italiano Mauro Tule Cornelli <3. Melhor comprar logo uns 200 para dar de lembrancinha no Natal – figurinha da Lucy com a mãozinha direita no queixo e pensando

Você surtou de vez. O dinheiro não vai dar nem pras contas do mês

Fecha a loja e vamos logo para Paris, viver de brisa e tentar descobrir onde é o tal café que ele vai todo dia

Lourenço sai e me deixa falando sozinha

O processo de escrita do roteiro foi bem estressante. Eu e meu marido nos damos muito bem em quase todos os sentidos; levei 24 anos para descobrir que não é muito agradável trabalhar com ele. Lou estava preocupadíssimo com a responsabilidade e eu pensando na roupa que usaria. Ele não queria deixar escapar nem um detalhe e eu fazendo selfie com Roberta, Alê e Maurício

Ele criou um texto com todas as frases iniciais de cada livro. A responsabilidade para começar era dele. Entramos de mãos dadas, cúmplices desde sempre

Eu estava segura, como sempre estou, porque ele está ao meu lado, sempre, cuidando de coisas que eu não posso cuidar

Na minha primeira viagem de avião, pegamos uma turbulência horrível, Marcelo de Campos é testemunha e eu achei que era aquilo mesmo, que o avião pulava daquele jeito. Os meninos não falaram nada e quando descemos, exultei

– Gente, é muito divertido isso. Não sei por que as pessoas tem tanto medo

O Lou nunca me contou que foi uma das piores turbulências que ele já pegou e que não falou nada para não me assustar. Fala se isso não é uma lindura linda de viver???

Fiquei feliz por ter sido escolhida, é óbvio mas quem me conhece mesmo, sabe que eu fiquei mais feliz porque escolheram o Lourenço primeiro!!!

Pra mim, apresentar o prêmio é mais legal que ganhar o prêmio

Não fala isso, Lucy. Ano que vem a editora não vai querer nem inscrever seu livro

Eu não estou falando que se eu ganhar um prêmio não ia ficar feliz. Estou dizendo que apresentar é mais legal que ganhar

Se você ganhar então dá o dinheiro pra mim

Combinado, se a gente tiver acertado todas as pendências, eu te dou

Eu e o Lou já trabalhamos juntos mas foi em outras circunstâncias. No teatro de bonecos e quando eu respondia emails e entrevistas com ele. Ele ditava e eu só digitava. Amo trabalho de secretária. Preciso incluir no meu currículo. Até hoje tem gente que me escreve e pede: oi, Lucimar, será que você pode pedir ou mostrar pro seu marido. Antes eu ainda falava, agora, respondo que não sou menina de recados e mando: ele tá no face também e cuida direitinho dos emails. Demora mas responde <3

Seguimos. Lado a lado

Desta vez fui colocada ao lado do Mutarelli não como esposa ou secretária. A Selma fez questão de me colocar como escritora

O Lou representa os homens e você as mulheres

E os trans?

Ano que vem a gente pensa nisso. Corre que já está em cima da hora. E eu achando que ia conhecer o Chico. 30 anos depois e eu estou no palco, apresentando um prêmio com meu marido e o Chico é um dos concorrentes. É tipo um sonho, não dá pra acreditar. Lou me faz entender que sua escrita na Literatura é tão diferente porque veio dos Quadrinhos e com o Chico a mesma coisa. Ele veio da Música, traz contribuições diferentes

Todas as linguagens artísticas são igualmente importantes. Não gosto de quem classifica como alta ou baixa literatura isso é bobagem. O Roberto é igual ao Chico. São dois compositores da Música Popular Brasileira e Cantores. O Roberto não escreveu livros e não era filho de intelectuais. Os dois terão a sua página reservada na história. Se um cara leva 10 anos para escrever um livro e faz mestrado e doutorado e outro que escreve em 5 dias, pra mim, tem o mesmo peso. A mesma importância. Vou ler 10% (como me ensinou Flavio Seibel) e eu decido se continuo ou não a leitura

E, ainda assim, nada disso garante que um livro será bem vendido ou não. Aquilo que está escrito precisa ser bom para alguém. Se for bom, vai chegar ao destino final, o leitor. Tem ainda o problema da editora, publicação, distribuição, etc, o problema não é mais do escritor

A única preocupação dos escritores deve ser somente com a escrita e andar com seu livro embaixo do braço, protegido embaixo das suas asas – metáfora do Mestre Marcelino

O Auditório não disponibiliza a gravação do evento. Do pouco que me lembro, eu e o Lou estávamos realmente ligados um no outro e fizemos um bom trabalho

Fazer marketing, se autopromover no facebook. Ter voz própria, saber defender seu lugar, seu trabalho. Falar do seu quintal

Com quem você aprendeu isso?

Com os professores Bellotto, Mutarelli, Marcelino e Tiezzi

Até no facebook eu aprendo. Sigo pessoas que mostram seu quintal, a sua casa porque é disso que eu gosto. A Ilha de Caras, Revista Contigo. Quero sangue, glamour e briga de tia com sobrinhos. Filma tudo e compartilha pra gente ver. Gosto de ver o circo pegando fogo mas aqui, sentadinha na poltroninha

O que eu ouço, entra em mim e sai transformado, diferente

Vai falar de cocô de novo?

Não, Antropofagia. Você come o outro e tira dele só aquilo que precisa. O resto você caga

Semana de 22?

Sim, Oswald de Andrade total

Precisa estar atento a tudo e todos. Artistas bons e ruins

Mas, professora, você falou que não existe isso de arte boa ou arte ruim

Isso é o que eu acho; a crítica permanece classificando Arte com estrelinhas. É tipo dar notas na escola. Ninguém aguenta mais isso

A senhora falou que ia cair na prova

Sim, vai mesmo, enquanto a gente aceitar o sistema vai continuar tudo a mesma merda (mais uma que aprendi com meu filho)

Aprendeu nada. Você já falava isso quando era adolescente. Você sempre foi contra o sistema

É mesmo. Tinha esquecido. Até esqueci que cresci ouvindo o Chico e a primeira frase do meu primeiro livro é dele

Jura?

Hoje eu contei as estrelas e a vida parece um filme

E quando você lembrou disso?

Quando tocou o Primeiro Sinal e pensei: vai começar a aula. Não é teatro, é aula

Você ainda não quer voltar a ser atriz?

Não, de jeito nenhum. Não tenho paciência para decorar texto e ninguém merece todo o nervoso que antecede a berlinda. Não estava fingindo. Fui eu mesma. Eu sou daquele jeito quando dou aula. Representei a Professora Lucimar

Então pra quê Roteiro? Podiam subir lá e falar e pronto

Não é assim. Um show precisa de direção, guia, equipe técnica, luz, figurino, som, recepcionistas, secretários, seguranças. Todos juntos fazendo a sua parte da melhor forma

Não esquece da plateia

Nunca. Jamais esqueço daqueles que estavam presentes e alguns que não foram porque não puderam e não porque não queriam estar lá com a gente. Pode estar com algum problema, de trabalho ou um enfermo na família ou festa de fim de ano da firma e manda recadinho no face, figurinha no celular, email, tudo. Tem gente que foi e você nem viu. Gente que não foi e você jura que viu. Foi lindo. Parecia uma sala de aula brilhante e colorida. Estava a vontade porque não estava sozinha. Sentia o Lourencinho vivo. Ao meu lado. Ninguém a frente ou atrás do outro. Ao lado no tablado, de mãos dadas. Cúmplices como sempre fomos mesmo quando caminhamos para lados opostos

Isso vai cair na prova também?

Já caiu, amor. Já passou, já foi. Pode ir

E a recuperação?

Ficamos todos de recuperação. Buscamos curar nossas feridas

Isso é do Platão?

Putz. Eu não sei. Pergunta pro Google

Essa piada é minha

Mas você falou que isso não importa. Que o ator não precisa falar quem escreveu o texto que ele está falando. Pra mim importa quem escreveu. Quem conta a história. A História é a matéria mais importante

Papinho de comunista

É mesmo. Por isso estamos dentro de um Niemeyer

E eu passei de ano?

Passou em Artes. Matemática e Química, tem que esperar aqui

Puxa, Prô, queria que todos os professores fossem legais como a senhora

Eles são só precisam de alguém que os lembre disso

Todos temos bons e maus professores, exemplos. É só escolher aqueles que vamos seguir

Posso ir?

Pode. Obrigada

Obrigada de quê?

Por sua companhia aqui

Eh nóis

Tamo junto

Estar ali com meu ídolo amado idolatrado escritor desenhista professor mestre dos quadrinhos Lourenço Mutarelli foi quase como estar na sala de casa bebendo, fumando e comendo e falando de livros e filmes e bostas que acontecem na vida com nossos melhores amigos, minha família, meu filho e meu marido

E pra mim, foi tipo isso e como sou muito mal acostumada só o que interessa aquilo que é feito pra mim

Vida longa ao Oceanos e para todos os rios que convergem para este mar de Maria, Marina, Maria Lucia, Marli, Marcio, Marcia, Lucimar, imenso e azul e profundo e recheado de pérolas e todos aqueles que tem a Lua na cabeça e o coração no Mar

Sempre

Viva a Literatura Brasileira Contemporânea

E a Melissa?

Melissa não tem mar

Mas tem Mel e é tão doce quanto

Mery tem mar também. Internacional!!!! – um copo americano e uma latinha brindando

E se o Mateus fosse caipira a gente podia chamar ele de Mar Teus – carinha de ET rindo tímido

Perguntei no face do Glauco sobre a frase que ele falou quando subiu para receber  e agradecer o prêmio e foi essa resposta que recebi dele por email

Lu, respondendo à pergunta que o Akira achou no meu facebook, o Lennon
obviamente não fallava portuguez mas o som da lingua não lhe era
extranho. Como todo anglophono, elle não distinguia hespanhol de
portuguez ou italiano, mas a palavra “obrigado”, que é só nossa,
apparesce no phraseado joyceano que elle declama na lettra de “Sun king”
(canção do album ABBEY ROAD), da qual extrahi estas palavras que usei na
entrega do premio:

“Questo OBRIGADO tanto mucho que felice corazón”

Era isso. Beijo do
GLAUCO MATTOSO

Copio, colo e uso as palavras do John, Glauco e Caetano, que não foi mas ano que vem eu acho que deveria ser homenageado porque todas as letras e histórias que escreveu dariam um livro muito bonito

vamos atentar para a sintaxe dos paulistas
e o falso inglês relax dos surfistas
e que o Chico Buarque de Holanda nos resgate
e xeque-mate
explique-nos Luanda
ouçamos com atenção os deles e os delas da TV Globo
sejamos o lobo do lobo do homem
adoro nomes
nomes em ã
de coisas como rã e ímã
nomes de Nomes
Como Scarlet Moon de Chevalier
Glauco Mattoso
Arrigo Barnabé
e Maria da Fé

gosto de sentir a minha língua roçar a língua de Luís de Camões
gosto de ser e de estar
e quero me dedicar a criar confusões de prosódia
e uma profusão de paródias
que encurtem dores
e furtem cores como camaleões
poesia concreta
prosa caótica
ótica futura
samba-rap
chic-left com banana
nós canto falamos como quem inveja negros
que sofrem horrores no Gueto do Harlem
livros, discos, vídeos à mancheia
e deixa que digam, que pensem, que falem

 

Tipo isso

Beijo da

Lu de Souza Ribeiro Mutarelli

lucimar-mutarellinovo

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