“o rato roeu os caprichos”, poema livre com Nil Kremer

Dancer, de Joan Miro (1925 )

Dancer, de Joan Miro (1925)

o rato roeu os caprichos
capítulo de introdução
roeu a estria
frio na barriga
roeu cantigas fora do tom

roeu logo
marcas de alto custo
roeu o busto artificial
roeu a claridade da sombra
roeu o roteiro preciso
de futuros impróprios
roeu rótulos de medicação
roeu alívios imediatos
roeu destroços
náufragos remorsos

esse rato condômino
anônimo lambeu a louça da pia
roeu a agonia armazenada
depósitos de estrada
roeu
os nada
nichos de pequenas coisas
farelos de ontem na foto amarelada
a piada sem graça
a pirraça do espelho
roeu a traça antes da folha
roeu o papão patrão ponto
o canto gelado da cama
as certezas do espelho
o vermelho mangue
sugou o sangue
frio
roeu o que eu era
e o que sou cuspiu

nil-kremer

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