
Rafa Carvalho (Foto de Sabrina Sanfelice)
para ler ouvindo “joga”
proporcionalmente
eu queria o mistério
dos orgasmos juntos
como fosse o tempo a islândia
e nós, gozando: as vozes cantantes da islândia
a islândia todo o tempo do mundo, à sua população pequena
e os instantes de nossos orgasmos
à proporção de antony, björk
the johnsons, sigur rós
outros poucos
e, proporcionalmente tantos
você sabe qual a população da islândia?
eu queria a potência avassaladora de uma candidíase
sem coçar nem doer a não ser saudade
queria a vantagem combustível
do óleo diesel
mas queimar sem poluir nem ameaça
amor, não é triste não podermos alugar uma campvan
e irmos pra islândia? uma lástima sermos tão suscetíveis aos fungos?
hoje eu acordei me sentindo a islândia
a islândia sem erik nem deuses
só fungos
os fungos ilhéus desbravadores vikings de nós e gente
eu acordei me sentindo essa ilha
em suas praias de gelo
que vozes cantarão em mim?
que natureza rara se revelará em mim?
como atrair os fungos todos para a groenlândia
e para longe de mim?
eu hoje acordei pensando no direito que temos
de estruturar, nossa in se mitologia
em minha, você devasta cada fungo
e reina única em todos territórios
pélvico e outros
depois do gelo das praias, tudo é gêiser-vulcão
e já podemos deitar na grama
contar estrelas
e vibrar pelas vozes, que cantem na islândia
★★★
arcada
quisera sobrevivessem todos os cavalos.
mas não. quem dera.
os cavalos morrem.
alguns são mortos. no japão
para serem comidos
no japão
outros em minas. gerais
para serem comidos
no japão.
muitos, mortos por maus tratos.
e aqueles que não são:
não são mortos
mas escolhem
mesmo assim
pela morte.
também esses. morrem. por maus tratos.
param de comer. de beber.
e aguardam. paz.
cientes
a morte.
cavalos de turim. cavalos de tróia. cavalos de pau.
quisera essa paz. ciência equina.
essa contenção de força
de si. esse passe
mas não.
não os tenho.
sou bem menos forte.
sou. também. tão menos disposto
à morte.
a morrer. essa morte.
não fui dado a quem quer que seja.
sou meu até os dentes.
e não há nada
para olhar aqui, senhor.
★★★
notas sobre o shop-suey do rong he
que estação é essa?
faz frio. garoa.
e o céu tem a cor de um pombo morto há 3 dias.
a vista da janela é um país desmoronando.
construção com gente dentro.
gritos de crianças
e o cheiro
da carniça.
ainda temos um terço. dessa garrafa
de vinho. ainda temos o sexo
com as janelas
fechadas.
as pessoas não são como seus retratos
– quase nunca. nunca é tarde
para ler dostoiévski –
quase sempre.
amanhã vamos à missa.
quero, dentre outras coisas, agradecer
que a pedra do arroz chinês não quebrou meu dente.
a facilidade, com que o meu dedo escorrega
para dentro de você. e o roxo
dessa noite roxa
estranhamente linda. de uma chuva vindoura. e poluição.
pela janela de outro prédio no glicério
voa abaixo na baixada um outro jovem
– esse tinha a nossa idade
ou era menos? a nossa cidade, ou era menos?
nossas janelas fechadas. e não vimos
nem isso, nem à noite
que já era.
roxa
como a catuaba vomitada dos otakus
no metrô.
e por janelas abertas e fechadas
pessoas. coisas. e o tempo: voam
não resta o terço, amor.
e amanhã vamos à missa.
quero rezar por esse jovem
e o mendigo da bahia
que encontramos hoje cedo
por aqui: na liberdade
ele só queria um almoço
e no entanto, nenhum verso
será maior, que o quero feijão
com farinha
que ele disse
vamos abrir as janelas, amor
e aceitar os gritos da madrugada. amor
talvez alguma luz nos acorde à manhã nova. sim
amor.
que amanhã vamos à missa.
quero agradecer a facilidade
dentre outras coisas
com que aquela fome seca. de farinha
ainda escorrega
pra dentro
de mim.
★★★
★★★★★★
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